O Senado iniciou nesta terça-feira os trabalhos da CPI da Covid, comissão que vai investigar as ações e possíveis omissões do governo federal durante a crise sanitária no Brasil. O senador Renan Calheiros (MDB-AL) foi indicado para ser o relator da CPI da Covid pelo presidente eleito pela comissão, Omar Aziz (PSD-AM). A escolha representa a primeira derrota de parlamentares aliados do governo Bolsonaro — que manobraram para barrar o nome de Renan.

Logo no início da sessão, os parlamentares foram informados que  o Tribunal Regional Federal da 1ª região (TRF-1) suspendeu a liminar de primeira instância que impedia o senador Renan Calheiros (MDB-AL) de assumir a relatoria da CPI da Covid. A decisão foi uma resposta ao recurso apresentado pela Mesa do Senado Federal, que recorreu de uma liminar concedida em uma ação popular movida pela deputada bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP), aliada do presidente Jair Bolsonaro, junto ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

Em seu primeiro discurso como relator da CPI da Covid, Renan criticou o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, mas sem citá-lo diretamente. Ele comparou a nomeação de Pazuello e a militarização do Ministério da Saúde durante a pandemia ao envio de um infectologista para comandar as tropas em uma guerra.

— O resultado fala por si: No pior dia da Covid, em apenas 4 horas o número de brasileiros mortos foi igual a todos que tombaram nos campos de batalha da Segunda Guerra. O que teria acontecido se tivéssemos enviado um infectologista para comandar nossas tropas? Provavelmente um morticínio. Por que guerras se enfrentam com especialistas, sejam elas bélicas ou sanitárias. A diretriz é clara: militar nos quartéis e médicos na Saúde. Quando se inverte, a morte é certa. E foi isso o que aconteceu. Temos que explicar, como, por que isso ocorreu — disse Renan.

O senador afirmou ainda que a comissão “será um santuário da ciência” e uma antítese ao “obscurantismo negacionista”.

—  Estaremos aqui para averiguar fatos e desprezar farsas. Para tanto, usaremos das instâncias técnicas do Estado, como Polícia Federal, Ministério Público, TCU, a consultoria do Senado e outros organismos que se fizerem necessários. A comissão será um santuário da ciência, do conhecimento e uma antítese diária e estridente ao obscurantismo negacionista e sepulcral, responsável por uma desoladora necrópole que se expande diante da incúria e do escárnio desumano. Essa será a comissão da celebração da vida, da afirmação do conhecimento e, sobretudo, da sacralização da verdade contra o macabro culto à morte e contra o ódio. Os brasileiros têm o direito de voltar a viver em paz.

Renan disse ainda que vai se pautar com a “isenção e a imparcialidade” que a função impõe. Ele também prometeu uma investigação técnica e despolitizada.

— O que nos compete é construir alianças para que essa CPI possa caminhar cada vez mais com absoluta maioria em torno da busca pela verdade. Me pautarei pela isenção e imparcialidade que a função impõe, independente de minhas posições pessoais — disse Renan.

Após a escolha de Renan como relator da CPI, Aziz indeferiu uma questão de ordem apresentada pelo senador Jorginho Mello (PL-SC), aliado do governo, que queria impedir a escolha do senador alagoano por considerá-lo suspeito. Aziz também criticou a decisão liminar em primeira instância que tinha a mesma intenção, mas acabou derrubada pelo TRF-1 momentos antes da votação. O argumento é de aliados do governo é que Renan é pai do governador de Alagoas, Renan Filho, que poderia vir a ser alvo das investigações. A CPI tem como um dos objetivos apurar repasses federais aos estados e municípios.

Em outra frente de ataque, senadores governistas tentaram suspender a instalação da CPI com a alegação de que os integrantes não podem participar de duas comissões ao mesmo tempo. Após duas horas de sessão, os senadores votaram para escolher os seus integrantes.

Com oito votos, o senador Omar Aziz (PSD-AM) foi eleito presidente da CPI da Covid nesta terça-feira. O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) teve três votos e saiu derrotado. Na vice-presidência, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) foi eleito com sete votos. Houve quatro abstenções.

Após ser empossado na presidência da CPI da Covid , Aziz disse que ninguém pode ser protegido no colegiado. Ele defendeu que é preciso descobrir “o que deixou de ser feito” na gestão da pandemia, “seja ele ministro, assessor ou quem for”.

— Vamos seguir daqui para frente com toda a dignidade que o povo brasileiro espera da gente – declarou o senador.

O parlamentar também defendeu ações equilibradas para ajudar no combate à pandemia e disse que não vai permitir que questões políticas interfiram nos trabalhos.

— Sei que o debate será proveitoso e que essa CPI levará uma esperança maior na aquisição de vacinas, kits e tecnologia para que possamos dar uma esperança para milhares de pessoas. Não dá para a gente discutir questões políticas em cima de quase 400 mil mortos — disse Aziz.

Ele afirmou, ainda, que é preciso ter isenção porque entre os mortos pelo novo coronavírus há pessoas de diferentes correntes políticas:

— Essa CPI não pode servir para se vingar de ninguém, ela tem que fazer justiça pelos órfãos que perderam o pai e a mãe e agora têm futuro incerto. Essa CPI não é de 11 senadores titulares e 7 suplentes, ela está no lar de todos os brasileiros.

Entre os convocados mais prováveis da CPI estão os ex-ministros da Saúde do governo Bolsonaro, Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello, e o ex-secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wanjgarten.

Aliado de Bolsonaro, Ciro Nogueira (PP-PI) afirmou que votou em Omar Aziz para presidir a relatoria. Segundo Nogueira, Aziz lhe prometeu que seria “imparcial” na condução dos trabalhos. O presidente nacional do PP, no entanto, disse ver com “preocupação” o fato de Renan Calheiros assumir a relatoria da investigação.

— Parabenizo Randolfe pela vice-presidência e digo a Renan: neste momento não vejo obstáculo algum para que seja relator. Há uma hora atrás, existia uma decisão judicial, que era absurda, mas existia. Não se pode cumprir uma decisão e descumprir outra. Se essa CPI está funcionando é por conta de uma decisão judicial. Não vejo obstáculo, Renan, (porque a decisão que havia foi derrubada). Eu vejo preocupação. E espero que minhas preocupações se percam no tempo. Espero que saiba honrar essa vontade do nosso presidente, da maioria, de ser relator — disse.

— Tenho total divergência que, no caso de acusação contra seu filho (o governador de Alagoas, Renan Filho), o senhor vai se ausentar. Não existe “meio relator”. Ou é relator ou não é. Espero que não haja nenhum tipo de acusação contra seu filho, que é um grande amigo meu, mas se isso vier a ocorrer, o senhor tem que relatar. Até porque ficará sob sua responsabilidade a elaboração do relatório será final — argumentou Nogueira.

Por G1

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