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Acaba de ser lançado em Brasília o livro “Diálogo de Saberes: relatos da Embrapa”, o segundo volume da coleção Povos e Comunidades Tradicionais. A coletânea, de 634 páginas, traz experiências de pesquisa, desenvolvimento, compartilhamento e construção de conhecimento em situações de interação da Embrapa com povos e comunidades tradicionais em várias regiões do Brasil. A Embrapa Pantanal participa da obra com três capítulos, envolvendo os pesquisadores Débora Marques, Ubiratan Piovezan, Fábio Galvani, Alberto Feiden, Aurélio Borsato (recém-transferido para o sul) e a saudosa Aldalgiza Campolin.

Krahô

O capítulo 5 da coletânea traz artigo sobre a terra indígena Krahô, localizada entre afluentes da margem oeste do Rio Tocantins. A área foi demarcada em 1944. Com o avanço da agricultura no Centro-Norte do Brasil, culturas anuais se instalaram nas redondezas da reserva a partir do fim dos anos 1990.

O trabalho descreve o clima, o sistema hidrográfico, a vegetação e a fauna local. A vivência foi a metodologia de abordagem, com contatos registrados entre maio e outubro de 2008. Entrevistas semiestruturadas e armadilhas fotográficas também foram utilizadas para a pesquisa.
Uma tabela apresenta nomes e classificação Krahô para algumas espécies animais. O estudo mostra que os Krahô são um grupo étnico caçador-coletor, adaptado a um estilo de vida seminômade, que compulsoriamente se transformou em agricultor quando o território foi demarcado.

“A compra de carne fora da reserva é uma realidade para as unidades familiares Krahô. Se considerarmos o nível de ingestão proteica recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (0,7 g/dia de proteína por quilograma de consumidor), a caça abatida na região não supriria as necessidades proteicas da comunidade”, escreveram os autores.

E continuam: “Embora preliminar, este estudo permite concluir que a fauna figura como importante elemento da economia, cultura e da cosmologia Krahô, sendo percebida localmente de modo distinto do padrão biológico ocidental”.

O título deste capítulo é “Etnozoologia, caça e uma introdução sobre os animais da terra indígena Krahô” e os autores são Ubiratan Piovezan, João Vieira Diniz Neto, Feliciano Krahô, Terezinha Dias, Vinícius Antunes e Fernando Schiavini.

Bocaiuva

O 10º capítulo da coletânea caracteriza a Comunidade Antônio Maria Coelho, localizada na borda oeste do Pantanal, a 45 km da área urbana de Corumbá. A organização social dos moradores, a prática da agricultura familiar e os conflitos vivenciados em função da instalação de uma usina siderúrgica e da ampliação de projetos de mineração na região são relatados pelo grupo de pesquisadores.

A metodologia é baseada no Diagnóstico Rural Participativo (DRP) e as técnicas utilizadas para levantamento de dados incluíram diagrama histórico, caminhada transversal, árvore dos sonhos, reuniões, entrevistas semiestruturadas, mapa participativo e dinâmica de etnoseleção dos frutos de bocaiuva.

A comunidade vem sendo estudada pela Embrapa Pantanal e parceiros desde 2004. “O povoado vem sofrendo com a reorganização socioespacial por causa do processo de desapropriação dos seus lotes para instalação da siderúrgica, fato que dificultou a permanência na localidade e interferiu na vida social, cultural, ambiental e produtiva das famílias”, contam os autores.

De acordo com o texto, “o conhecimento tradicional do grupo de mulheres coletoras a respeito da extração, fabricação e comercialização dos produtos derivados da bocaiuva faz com que seu extrativismo estabeleça uma forte identidade com o local”. As pesquisas científicas podem ajudar esse grupo a melhorar sua realidade econômica e ambiental.

O capítulo “Comunidade Antônio Maria Coelho: territorialidade e resistência pelo uso da bocaiuva no Pantanal de Mato Grosso do Sul” foi escrito por Alberto Feiden, Aldalgiza Inês Campolin (in memoriam), Fernando Fleury Curado, Isabelle Monaco, Tayrine Fonseca, Aurélio Vinicius Borsato, Fábio Galvani e Simone Palma Favaro.

Tuviras

O 21º capítulo, intitulado “Distribuição e diversidade de tuviras (Gymnotiformes) exploradas como iscas vivas no Pantanal Sul” trata da pesca profissional artesanal como uma das principais atividades econômicas desenvolvidas na Bacia do Alto Paraguai. A pesca de iscas no Pantanal se intensificou a partir dos anos 1990 em função do crescimento do turismo de pesca. Apesar da intensa exploração de tuviras para o comércio de iscas vivas, não se sabia quais espécies vinham sendo vendidas e utilizadas pelos pescadores locais.

A metodologia descreve as diferentes comunidades de ribeirinhos visitadas: Barra de São Lourenço, Baía do Castelo, Codrasa e Porto da Manga. As expedições ocorreram em diferentes momentos, contemplando períodos de cheia e de vazante.

“O mapeamento das áreas de ocorrência desses peixes foi baseado na marcação dos locais de pesca com GPS, no trabalho com imagens de satélite e na confecção de mapas pelos próprios pescadores. As espécies de peixes foram confirmadas pela análise de cariótipos e pela aplicação de marcadores moleculares”, explicam os autores.

As análises realizadas entre 2010 e 2014 confirmam: “a diversidade de espécies de tuviras comercializadas no Pantanal é maior do que se acreditava, apesar de o mercado se concentrar em um único gênero. Isso pode indicar que a pesca realizada por essas comunidades não tem comprometido a diversidade desse recurso natural no Pantanal Sul”.

São autores os pesquisadores Débora Karla Silvestre Marques, Fernando Fleury Curado, Ubiratan Piovezan, Paulo Cesar Venere e Rodrigo da Silva Lima.

A coletânea pode ser adquirida na Livraria Embrapa por R$ 100.

Por corumbaonline