Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que começa neste domingo, reúne gerações de alunos que tiveram grande parte da formação do ensino médio em aulas a distância, por causa da pandemia que já dura quase três anos. Com isso, a rotina de preparação teve de ser reinventada, para superar desafios de aprendizagem e saúde mental.

Além disso, a prova – principal vestibular de universidades públicas e privadas do País – tem visto uma gradativa queda do total de inscritos. Serão 3,39 milhões nesta edição, ante um pico de 8,72 milhões em 2014. Neste domingo, os candidatos fazem provas de Redação, Linguagens e Ciências Humanas, a partir das 13h30. Na outra semana, serão as questões de Matemática e Ciências da Natureza.

“Foi um período bastante complicado. Teve momentos em que pensei em parar (de estudar) e esperar tudo isso acabar”, conta o estudante Sander Vitoriano, de 18 anos. Morador de Rio Branco (AC), ele estava no 1.º ano do ensino médio no início da pandemia e foi infectado pelo coronavírus. O jovem se recuperou rápido, mas o pai ficou internado por 24 dias. “Mal tinha tratamento ainda”, relembra.

O susto inicial passou, mas a pandemia fez com que o estudo ficasse em segundo plano. Sander relata que a escola pública em que estudava demorou a se adaptar e, na maior parte das vezes, eram ofertadas só aulas gravadas. O jovem se juntou, então, a mais três colegas e passou a fazer videoconferências para discutir as matérias e fazer exercícios. “Eu não entendia o conteúdo, mas o que estava ao meu alcance e dos meus amigos, nós fazíamos”, diz ele, que quer cursar Letras.

Sander não está sozinho. Dados do Saeb, avaliação oficial do Ministério da Educação (MEC), indicam que a aprendizagem de Português e Matemática caiu em todas as séries na pandemia. A média de Matemática no ensino médio recuou para os níveis de 2013. Exemplo: os alunos não conseguem determinar o valor reajustado de uma quantia a partir de seu valor inicial e do porcentual de reajuste.

Estreante no Enem, Gabrielle Silva, de 17 anos, relembra que, quando a escola pública em que estuda fechou, no 1º semestre de pandemia, a expectativa era que as aulas voltassem em duas semanas. “Mas praticamente não tive o 1.º ano”, conta ela, de Planaltina (DF). A escola em que estuda só começou a ter aula online no ano passado e retomou o presencial no fim de 2021.

Para especialistas, somada à fragilidade do ensino remoto, a perda do vínculo dos adolescentes com a escola é outro fator por trás da queda de inscritos no exame. Pesa ainda o empobrecimento das famílias, que impõe a jovens a obrigação de ajudar na renda da casa.

Sem um computador que comportasse o programa de aulas online usado pela escola, Lucas Almeida, de 19 anos, teve de acompanhar o conteúdo pelo celular no início da crise sanitária. “Praticamente não consegui aprender nada no meu 3.º ano.” Com isso, a nota no Enem 2020 foi bem aquém do esperado.

Na Redação, ele tirou 340 (em mil), o que frustrou os planos de cursar Medicina. Lucas ingressou no ano seguinte no MedEnsina, cursinho popular gerido por alunos da USP, e passou a percorrer um trajeto diário de quase 2 horas – ele mora em Guaianases, zona leste de São Paulo, e as aulas são na área central.

A trajetória é parecida com a de Daniella Pinheiro, de 18 anos. De Itaquera, também zona leste, ela estava no 2.º ano na rede pública quando chegou a covid. A aula só voltou ao presencial pouco antes do Enem do ano passado.

Apenas cinco alunos, de uma sala com 40, fizeram o exame. “Fui uma delas, mas não sabia nem por onde começar.” Em busca de uma nota melhor e uma vaga em Medicina, ela ingressou no mesmo projeto que Lucas. “Descobri os meus pontos fortes e no que posso focar para atingir meus objetivos”, conta.

“Aproveitei mais o 2º ano”, conta. Para reparar o prejuízo na aprendizagem, ele optou por, dentro do próprio colégio, fazer aulas de reforço de Ciências da Natureza, Matemática e Redação. Vestibulando de Direito, agora diz se sentir mais preparado para o exame.

“O aluno deve valorizar o seu crescimento e a sua trajetória. Não se comparar e não duvidar do próprio processo”, recomenda Priscila Fidelis, psicóloga do Bernoulli.

Por Portal Terra